Neuroarquitetura: a ciência do bem-estar

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Muito utilizado em projetos comerciais, esse conceito também pode ser trabalhado nas áreas comuns dos condomínios e trazer bem-estar para moradores e funcionários

Você já ouviu falar em neuroarquitetura? Esse conceito une conhecimentos da neurociência, psicologia, entre outras áreas relacionadas ao comportamento humano para criar ambientes que sejam agradáveis e que cumpram objetivos específicos como: promover relaxamento, foco, bem-estar, pertencimento, concentração, entre outros.

Para isso, são estudadas as influências que diferentes parâmetros causam no comportamento humano, como cores, iluminação, acústica, temperatura, vegetação, cheiros, texturas, ângulos e curvas. E a cultura de cada região também conta no desenvolvimento desses espaços, assim como faixa etária, gênero ou estilo de vida de quem vai circular pelos locais.

Ou seja, como os ambientes em que vivemos impactam nossa saúde física e mental, é possível criar projetos inteligentes que elevam a qualidade de vida de quem os ocupa. Para as arquitetas Priscilla Bencke e Gabi Sartori, fundadoras e curadoras de conteúdo da Academia Brasileira de Neurociência e Arquitetura (NeuroArq Academy), com esse conhecimento é possível criar projetos residenciais e comerciais mais voltados ao ser humano.

“A ‘neuroarquitetura’ nos dá base, por meio de pesquisa e estudos desenvolvidos pela ciência, para algo que já intuíamos, que é o impacto do ambiente no nosso dia a dia”, afirma Gabi. Esses reflexos podem ser positivos ou negativos, fixando no cérebro uma resposta afirmativa ou não ao ambiente.

Entre os projetos que a dupla já executou, elas destacam um que foi montado para uma empresa do setor financeiro, que após o período pandêmico solicitou intervenções nos novos escritórios. Nesse trabalho, a metodologia utilizada pelas profissionais envolveu as sete variáveis ambientais, aplicadas em uma avaliação de pós-ocupação através das ferramentas autorais da NeuroArq Academy.

Entre os elementos que foram analisados estão: o som, que influencia a cognição e o processamento de informação; o conforto acústico, que proporciona ambientes agradáveis para o trabalho e descanso, sendo que isso pode ser construído a partir de medidas simples, como o uso de painéis e elementos de absorção acústica, tanto em áreas de mobiliário quanto em pontos específicos do ambiente.

Além disso, elas também trouxeram elementos da biofilia, para uma conexão com a natureza, a temperatura e a iluminação, esta influencia o ritmo circadiano, ao levar em conta o impacto da luz no cérebro. A maior entrada de luz natural, em diferentes cômodos, pode aumentar a disposição e produtividade, bem como humor e bem-estar.

Outros fatores que também podem ser avaliados são as cores – que representam e dão a personalidade do espaço e de seus usuários – e os aromas, que despertam a memória e o apego. Tudo isso porque a composição dos ambientes tem a capacidade de impactar diretamente a rotina, de forma a motivar ou desestimular a presença das pessoas no local. Quanto mais personalizado o espaço, maior o sentimento de pertencimento e inclusão.

No Brasil, o maior foco desse tipo de ciência ainda são os projetos comerciais, como lojas e escritórios. Principalmente, para estimular a produtividade dos funcionários, melhorar o foco e a concentração. Contudo, a busca para espaços domésticos tem crescido.

“Por estarmos imersos em um espaço artificial, isso pode impactar muito o nosso bem-estar e até mesmo o senso de identidade. Ao aplicar conceitos de ‘neuroarquitetura’ dentro de casa, é possível aumentar a qualidade do sono, diminuir a ansiedade, além de tornar a morada mais aconchegante, acolhedora e harmoniosa”, pontua Priscila.

Pontos que devem ser observados na construção de um projeto

Por ser um projeto pensado para solucionar questões pessoais e psicológicas pelo uso de elementos que impactem positivamente as emoções e o bem-estar das pessoas, os espaços com neurociência aplicada à arquitetura possuem benefícios consideráveis. Só que, para isso, é preciso conhecer muito bem o público-alvo.

Para Gabi, quanto mais os profissionais de arquitetura estudarem para quem estão projetando, com questionamentos como “quem são essas pessoas”, “do que elas sofrem” e “quais são as queixas e sintomas que elas têm”, melhor será para entender o que pode ser feito no ambiente para auxiliá-las numa melhoria na qualidade de vida.

“Cuidados como esse reduzem o número de revisões e readequações e, mais que isso, têm a ver com a satisfação de entregar àquela pessoa um projeto do qual ela se sente pertencente, incluída e abraçada a todo momento. Algo significativamente importante para a manutenção do seu bem-estar”, explica a especialista.

Pensamento esse também compartilhado pela arquiteta Mônica Andrea Blanco, presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal. Segundo ela, a “neuroarquitetura” é uma ciência que parte do princípio de que as mudanças no entorno mudam o cérebro e, portanto, modificam o nosso comportamento.

“O briefing, necessário para conhecimento dos usuários do espaço, torna-se uma atividade de empatia, onde a história, cultura, situação financeira, estética, conforto ambiental, acessibilidade, serão pontos importantes a serem considerados quando da concepção dos espaços de uso comum”, avalia Mônica. Ela lembra ainda que, com a pandemia, o mundo mudou e, hoje, ambientes de convívio em espaços abertos, arejados, voltados ou complementados com a natureza tornam-se primordiais para o bem-estar.

Vale lembrar que a iluminação correta pode auxiliar no ciclo circadiano. Ou seja, na variação nas funções biológicas do ser humano, que são repetidas regularmente ao longo das 24 horas, e até na interação social entre eles. Além disso, as cores também atuam diretamente na construção dessa atmosfera. E um bom exemplo disso são os quartos infantis, principalmente os projetados para bebês, já que para eles a tranquilidade é algo essencial.

“Nesse sentido, se o objetivo é transmitir calma, com menos estímulos, para não deixar as crianças em alerta, o ideal é pensar em cores neutras”, destaca Priscila. Aliado a isso, ela ressalta a importância de ter pontos que estimulem a visão e isso é feito com a inserção de contraste, como cores vivas e contrastantes”, afirma.

Neuroarquitetura em condomínios

A adoção dos estudos da neurociência aplicada pela arquitetura é muito ampla e pode ser personalizada para diferentes casos, como as áreas comuns dos edifícios. Só que, para isso, é preciso, antes de iniciar o projeto, conhecer a fundo o perfil dos condôminos. A ideia aqui é entender como eles irão se relacionar com esses ambientes e nesses ambientes, para então definir o estímulo que deseja ser dado.

“Dessa forma, podemos pensar o tipo de iluminação, quais as formas que serão utilizadas, qual o paisagismo, quais as cores, entre outras questões que farão mais sentido para o público que for ocupar esses espaços. Também é possível fazer um trabalho de pós-ocupação, com instalações e alterações que favoreçam as pessoas, mesmo após os empreendimentos já estarem em uso”, pontua Gabi.

Além disso, Mônica lembra que, como estamos falando em compartilhamento de espaços, é preciso estar atento a questões de inclusão e mobilidade. “Se a ‘neuroarquitetura’ está focada nas experiências do usuário, os espaços comuns em condomínios devem, principalmente, atender às normas vigentes de acessibilidade e inclusão. O desenho tem que ser universal, já que esse conceito trabalha com a sustentabilidade e, como tal, segue as normas vigentes de construção e reforma”, analisa.

A arquiteta defende que trabalhar com esse conceito faz a arquitetura voltar à sua verdadeira função, com a concepção de espaços que sirvam ao usuário de maneira que ele consiga perceber a sua função e sinta-se seguro de modo a usufruí-lo da melhor forma e executar sua tarefa. “Há que respeitar suas necessidades, desejos, cultura, obedecendo às questões de conforto ambiental necessárias ao local e trazendo os conceitos de biofilia. Ou seja, incorporando a necessidade humana de contato com a natureza por meio de aplicação de elementos naturais e miméticos”, reforça Mônica.

Imagem: Freepik

Fonte: Condomínio SC

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